Conselho aplicou 102 sanções a juízes e desembargadores nos últimos dez anos
Da
corrupção pura e simples, materializada na venda de sentenças, ao abuso de
autoridade capaz de produzir gravíssimas distorções processuais, é extenso o
rol de irregularidades cometidas por magistrados que culminaram em algum tipo
de punição a juízes e desembargadores no Conselho Nacional de Justiça nos últimos dez
anos.
Desde
2008, quando o ainda jovem conselho puniu um magistrado pela primeira vez, o
CNJ já aplicou 102 sanções a juízes e desembargadores com penas que variam de
uma simples advertência à aposentadoria compulsória. Um juiz só está
sujeito à demissão durante os dois primeiros anos de atuação na carreira.
Depois desse breve período “probatório”, o magistrado passa a gozar de
vitaliciedade e só perde o posto por decisão judicial transitada em julgado.
O alcance
do CNJ, porém, é administrativo e o órgão não tem o poder de ordenar a prisão
de um juiz, por exemplo. Em casos de crimes, cabe ao Ministério Público fazer a
denúncia e o processo corre na Justiça comum. A maior
parte das punições (82) se deu no curso de 128 processos administrativos
disciplinares, quando o magistrado, de fato, responde perante o
conselho. O número de queixas que batem à porta do CNJ, entretanto, é bem
maior. Desde 2012, quando o conselho passou a tabular esses números, já foram
abertos mais de 38.000 procedimentos prévios, entre reclamações e sindicâncias.
Primeiro
corregedor-nacional de Justiça, entre 2008 e 2010, o ex-ministro Gilson Dipp
alerta para a necessidade de que o número de punições seja encarado sob
perspectiva, já que qualquer decisão que contrarie os interesses das partes
virou motivo para um protesto formal no CNJ. “Não se podem medir as punições
pela quantidade. Há que ver a gravidade.” O
ex-ministro cobra das cortes estaduais ou regionais um papel mais efetivo para
lidar com os desvios de seus juízes. “Há muita preguiça e falta de fiscalização
nos tribunais locais”, resume. Para Dipp, o CNJ tem se destacado nesse papel
punitivo em razão do “paternalismo” dos tribunais e considera uma “aberração”
que o conselho tenha que tratar de um processo que não está sendo conduzido ou
foi engavetado.
Um dos
procedimentos prévios que são abertos no conselho atende pelo nome de
Reclamação Disciplinar, que é aquela a que respondem o juiz Sergio Moro e os
desembargadores Rogério Favretto e João Pedro Gebran Neto pela constrangedora
batalha de despachos envolvendo a soltura do ex-presidente Luiz Inácio Lula da
Silva (PT) no dia 8 de julho. Só com um mínimo de indícios de favorecimento ou
parcialidade é que os três poderão ser formalmente processados. O CNJ
nunca julgou nada parecido ao episódio rocambolesco envolvendo o petista. O que
mais se aproxima é a investigação de dois desembargadores do Ceará pela
concessão indevida de habeas corpus em plantão judiciário. O caso, ainda sem
julgamento definitivo, tem como particularidade o fato de se tratar de uma
conduta supostamente reiterada de suas excelências, que libertavam presos numa
quantidade superior ao padrão dos colegas.
A
repetição de malfeitos é, aliás, um dos padrões de boa parte dos casos que
terminaram em punição no CNJ. Muito embora um único desvio funcional seja capaz
de render a penalidade, um mau juiz nunca erra uma só vez e sempre desfila sua
incompetência ou improbidade em uma sequência de atos que, no mínimo, atentam
contra a já combalida dignidade do Poder Judiciário.
Levantamento
feito por VEJA mostra que nem mesmo os altos salários, garantias e privilégios
oferecidos à magistratura são capazes de conter a vocação para um trambique.
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